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Author: mentesanta


A PREDESTINAÇÃO DOS SANTOS

(c. 10 e 15: P.L. 44, 974s. 981s)

Santo Agostinho

A diferença entre a predestinação a graça

Entre a graça e a predestinação existe unicamente esta diferença que a predestinação é uma preparação para a graça, e a graça é já a doação efetiva da predestinação.

E assim, o que diz o Apóstolo: “(a salvação) não provém das obras, para que ninguém se vanglorie; pois somos todos obra de Deus, criados no Cristo Jesus para realizar boas obras” [Ef 2,9s] significa a graça; mas o que segue: “as quais Deus de antemão dispôs para caminharmos nelas”, significa a predestinação, que não se pode dar sem a presciência, por mais que a presciência possa existir sem a predestinação.

Pela predestinação, Deus teve presciência das coisas que haveria de realizar; por isto; foi dito: “Ele fez o que ia ser” [Is 45 seg. os LXX]. Mas a presciência pode versar também sobre as coisas que Deus não faz como o pecado - de qualquer espécie que seja. Embora haja pecados que são castigos de outros pecados, conforme foi dito: “entregou-os Deus a uma mentalidade depravada, para que fizessem o que não convinha” [Rm 1,28], não há nisto pecado per parte de Deus, mas justo juízo. Portanto, a predestinação divina, que versa sobre o que é bom, e uma preparação, para graça, como já disse, sendo que a graça é efeito da predestinação. Por isto, quando Deus prometeu a Abraão a fé de muitos povos, dentro de sua descendência, disse: “eu te fiz pai de muitas nações” [Gn 17,4s], e o Apóstolo comenta: “assim é em virtude da fé, para que, por graça, seja a promessa estendida a toda a descendência” [Rm 4,16]: a promessa não se baseia na nossa vontade, mas na predestinação.

Deus prometeu, não o que os homens realizam, mas o que Ele mesmo havia de realizar. Se os homens praticam boas obras no que se refere ao culto divino, provém de Deus cumprirem eles o que lhes mandou, não provém deles que Deus cumpra o que prometeu; de outro modo, teria provindo da capacidade humana, e não do poder divino, que se cumprissem as divinas promessas, irias em tal caso os homens teriam dado a Abraão o que Deus lhe prometera! Não foi assim que Abraão creu; ele “creu, dando glória a Deus e convencido de que Deus era poderoso para realizar sua promessa” [Rm 4,21]. O Apóstolo não emprega o verbo “predizer” ou “pré conhecer” (na verdade Deus é poderoso para predizer e pré-conhecer as coisas), mas ele diz: “poderoso para realizar”, e, portanto, não obras alheias, mas suas.

Pois bem; porventura prometeu Deus a Abraão que em sua descendência haveria as boas obras dos povos, como coisa que Ele realiza, sem prometer também a fé - como se esta fosse obra dos homens? E então Ele teria tido, quanto a essa fé, apenas “presciência”? Não é certamente o que diz o Apóstolo, mas sim que Deus prometeu a Abraão filhos, os quais seguiriam suas pisadas no caminho da fé: isto o afirma clarissimamente.

Jesus Cristo, exemplar supremo da predestinação

O mais ilustre exemplar da predestinação e da graça é o próprio Salvador do mundo, mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo. Pois para chegar a ser tudo isto, com que méritos anteriores - seja de obras, seja de fé - pode contar a natureza humana que nele reside?

Peço que me responda: aquele homem [A palavra “homem” significa aqui, conforme se vê pelo contexto que “natureza humana”, embora não no sentido genérico desta expressão] que foi assumido, em unidade de pessoa, pelo Verbo eterno com o Pai, para ser Filho Unigênito de Deus, de onde mereceu isto? Houve algum mérito que tivesse ocorrido antes? Que fez ele, que creu que pediu previamente para chegar a tal inefável excelência? Não foi acaso pela virtude e assunção do mesmo Verbo que aquele homem, desde que, começou a existir, começou a ser Filho único de Deus? Não foi acaso o Filho único de Deus aquele que a mulher, cheia de graça, concebeu? Não foi o único Filho de Deus quem nasceu da Virgem Maria, por obra do Espírito Santo, sem a concupiscência da carne e por graça singular de Deus? Acaso se pôde temer que aquele homem chegasse a pecar, quando crescesse na idade e usasse o livre arbítrio? Acaso carecia de vontade livre ou não era esta tanto mais livre, nele, quanto mais impossível que estivesse sujeita ao pecado? Todos estes dons, singularmente admiráveis, e outros ainda, que se possam dizer, em plena verdade, serem dele, recebeu-os de maneira singular, nele, a nossa natureza humana sem que houvesse quaisquer merecimentos precedentes.

Interpele então alguém a Deus e diga-lhe: “por que também não sou assim?” E se, ouvindo a repreensão: “ó homem, quem és tu para pedires contas a Deus” [Rm 9,20], ainda persistir interpelando, com maior imprudência: “por que ouço isto: ó homem, quem és tu? pois se sou o que estou escutando, isto é, homem - como o é aquele de quem estou falando - por que não hei de ser o mesmo que ele?” Pela graça de Deus ele é tão grande e tão perfeito! E por que é tão diferente a graça, se a natureza é igual? Certamente, não existe em Deus acepção de pessoas [Cl 3,25]: quem seria o louco, já nem digo o cristão, que o pensasse?

Fique manifesta, portanto, para nós, naquele que é nossa cabeça, a própria fonte da graça que se difunde por todos os seus membros, conforme a medida de cada um. Tal é a graça, pela qual se faz cristão um homem desde o momento em que principia a crer; e pela qual o homem unido ao Verbo, desde o primeiro momento seu, foi feito Jesus Cristo. Fique manifesto que essa graça é do mesmo Espírito Santo, por obra de quem Cristo nasceu e por obra de quem cada homem renasce; do mesmo Espírito Santo, por quem se verificou a isenção de pecado naquele homem e por quem se verifica em nós a remissão dos pecados.

Deus, sem dúvida, teve a presciência de que realizaria tais coisas. É esta a predestinação dos santos, que se manifesta de modo mais eminente no Santo dos santos; quem poderia negá-lo, dentre os que entendem retamente os ensinamentos da verdade? Pois sabemos que também o Senhor da glória foi predestinado, enquanto homem tornado Filho de Deus. Proclama-o Doutor das Gentes no começo de suas epístolas: “Paulo, servo de Jesus Cristo, chamado para ser apóstolo, escolhido para o Evangelho de Deus, que Ele de antemão havia prometido por meio dos profetas, nas santas Escrituras, acerca de seu Filho o que nasceu da estirpe de Davi segundo a carne e foi constituído Filho de Deus, poderoso segundo O Espírito de santidade desde sua ressurreição entre os mortos” [Rm 1,1-4]. Jesus foi, portanto, predestinado: aquele que segundo a carne haveria de ser filho de Davi seria também Filho de Deus poderoso, segundo o Espírito da santificação, pois nasceu do Espírito Santo e da Virgem.

MENTESANTA

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